sábado, dezembro 13, 2008

Magnificat

O evangelista Lucas relata que Maria ficou completamente atônita (Lc.1:29) ao receber o anúncio do anjo Gabriel. Não era para menos! Ele disse que ela iria conceber e seu filho receberia três títulos: “Jesus”, que significa ‘Jeová salva’, “Filho do Altíssimo”, título reconhecidamente messiânico (Sl.2:7-8) e “Rei”, sendo que seu reino duraria para sempre. Mais ainda, o anjo lhe informou que ela seria ‘mãe’ mesmo sendo virgem e ainda não tendo terminado o período de 1 ano de noivado que antecedia o casamento. Diante de tamanha revelação e privilégio, ela compõe um cântico em louvor a Deus: o Magnificat de Maria.
Apesar da experiência de Maria ser única, sob vários aspectos é também a experiência (ou deveria ser...) de todo o cristão. O Deus que fez grandes coisas por ela também tem derramado Sua maravilhosa graça sobre nós! No v.50 ela afirma que a “misericórdia de Deus se estende aos que O temem, de geração em geração”.
Maria também canta sobre o poder de Deus invertendo os valores na vida daqueles que temessem o Messias:
1) Ele destronaria os poderosos e exaltaria os humildes. Historicamente fez isso com Faraó e Nabucodonozor, mas também se trata da maneira como Ele continua agindo na vida daqueles que se arrependem humildemente diante dEle;
2) Ele despede os ricos opressores de mãos vazias e aos famintos Ele enche de coisas boas. A esperança judaica de um rei justo e bom cumpriu-se no ministério de Jesus, e continua estendendo-se sobre o Seu povo espalhado por toda a terra, até que um dia não haverá uma só cidadezinha neste planeta onde as coisas não sejam feitas à maneira de Deus: “justiça, paz e alegria”.
Se desejamos receber as mesmas bênçãos que Maria recebeu, as qualidades que estavam presentes nela também precisam nascer em nós, principalmente duas: a) seu espírito humilde, através do qual ela submeteu-se a vontade de Deus mesmo vislumbrando o desafio de tornar-se personagem de uma história sem paralelo na caminhada humana, logo, sabia que seria alvo de controvérsias; b) mas também sua fome e sede das coisas espirituais e sua disposição de ser usada por Deus, as quais a mantiveram atenta e receptiva ao mover do Santo Espírito em sua vida.Que neste natal também estejamos grávidos da vida de Deus, e assim como Maria, sejamos os veículos do Altíssimo para trazer à luz, perante este mundo, as manifestações do poder, do caráter, da justiça e acima de tudo, do amor do Nazareno!!!

Adventus

O termo “advento” ou “adventus” em latim, antes de ser usada pelo cristianismo para lembrar o tempo de preparação necessária para a celebração do nascimento de Jesus Cristo, significava duas coisas: (a) O dia da visitação de Deus trazendo salvação aos fiéis; (b) A primeira visita oficial de uma pessoa importante para tomar posse e assumir o governo ou algum cargo importante ou, em grego “parousia” ou “epipháneia” (manifestação).
Várias vezes o Antigo Testamento fala do dia da visita ou vinda de Deus a seu povo para realizar Suas promessas (Jr.29:10; Zc.10:3, etc.). Principalmente após as experiências de exílio, o povo de Deus aguardava esse tão esperado dia de visitação espetacular que também marcaria o estabelecimento do reino definitivo de Deus.
O Novo Testamento afirma que Deus realizou esta visita na pessoa de Jesus Cristo de Nazaré. Quando Simeão vê o menino Jesus sendo apresentado no templo, ele diz: “Meus olhos já viram a salvação, que preparaste diante de todos os povos” (Lc.2:30-31).
Sim, o reino de Deus já começou a ser estabelecido na encarnação do Verbo Eterno e devemos nos preparar para entrar nele e cooperarmos com ele. João Batista, aquele que preparou o caminho para a vinda do Messias, com sua mensagem tem muito a nos ensinar sobre a devida preparação de nossas vidas para recebermos o Enviado de Deus, reconhecendo-O e tornando-nos cooperadores de Sua obra.
No evangelho de Lucas (3:1-15), diante da pregação do Batista, as multidões o interrogaram acerca de como estariam prontos para este novo tempo, a era messiânica. Disseram eles: “Que havemos pois de fazer?”. AO que João respondeu:
Ao povo em geral: “Quem tiver duas túnicas, reparta com quem não tem; e quem tiver comida, faça o mesmo”.
Aos publicanos (funcionários da Receita Federal de Roma, da época...), disse: “Não cobreis mais do que o estipulado”.
Aos soldados, disse: “A ninguém maltrateis, não deis denúncia falsa e contentai-vos com o vosso soldo”.
Preparamo-nos, segundo João Batista, para a era messiânica ou a chegada do Messias, colocando a vida em ordem. O chamado do evangelho é essencialmente ético e visa sempre mudança de caráter.
Somos chamados onde estamos, e aí onde nos encontramos devemos manifestar que cremos que o Messias chegou. Celebramos o natal reatando relacionamentos, pagando as dívidas, perdoando quem nos ofendeu e pedindo perdão aos que magoamos.
Nestas três semanas que antecedem a celebração do nascimento de Jesus, a chegada do grande Rei de toda a terra, devemos portanto, fazer uma faxina moral: os orgulhosos deveriam se quebrantar; os egoístas abrirem a mão e a vida; os líderes assumirem a posição de servos. Afinal, Jesus nasce num lugar humilde e longe dos holofotes e apenas os humildes de coração estavam prontos para a visitação de Deus.
Oxalá, cada um de nós esteja aproveitando este tempo do advento para consagrar-se, decidindo dar a primazia em sua vida ao senhorio de Jesus e tornando-nos assim um humilde estábulo onde a glória de Deus voltará a manifestar-se, só que agora, em nossas atitudes.

sábado, novembro 01, 2008

Por Que Tanta Dívida?

Contradizendo nosso querido Presidente Lula, a dívida Americana desembarcou em nossos portos e parece que não levanta âncora tão cedo. A economia brasileira que andava saudável “como nunca antes na história deste país”, foi atingida em cheio e está cambaleante, deixando economistas, autoridades e gente comum sem saber no que vai dar.
Qual foi o problema dos nossos vizinhos de cima, os norte americanos? Que rombo foi esse que o mundo inteiro está tendo que sacar do pé-de-meia pra poder cobrir?
Bem, na verdade, com base numa promessa que não se cumpriu, que dizia que “Sua casa de 100 mil hoje vai valer 300 mil amanhã, então, pegue um empréstimo de 200 mil”. Mas a “casa caiu”, e quando o amanhã chegou, a casa de 100 mil continuava valendo 100 mil e não havia como pagar os 200 mil. Imagine isto acontecendo numa escala de milhões de pessoas? Daí o caos no sistema financeiro americano: quem emprestou queria receber e quem tomou emprestado não tinha como pagar.
Trata-se de um velho problema alimentado pelo capitalismo: querer viver com mais do que se precisa, endividar-se para pagar às aparência e depois não conseguir pagar as dívidas. Por aqui sofremos do mesmo mal. Quantas famílias já chegando ao fim do ano endividados até o meio de 2009? Quantos não tendo como pagar os cartões de crédito, fáceis de tirar, mas difíceis de pagar? Quantos irmãos sendo infiéis a Deus porque foram fiéis a “mamom” (deus-dinheiro)?
O problema é espiritual! Insatisfeitos com o que se tem, busca-se cada vez mais, na ilusão de que a felicidade vem pela via do consumo. Assim, compra-se o que não se precisa com o dinheiro que não se possui. A alegria e a paz, distintivas do caráter cristão ficam comprometidas e famílias inteiras são abaladas.
Precisamos pedir ao Pai sabedoria e serenidade. Em tempos de recursos escassos, deve-se fugir das dívidas longas e dos investimentos muito ousados. Deixemos isto para os “reis da fortuna”, gente que possui milhões de dólares, e se perderem algum, não fará a menor falta.
Quem não se contenta com o que possui, seja muito ou pouco, estará sempre insatisfeito! Precisamos pedir a Deus ajuda para sabermos ser felizes com aquilo que já possuímos, pois do contrário, precisaremos gastar cada vez mais na ilusão de que “ainda nos falta algo para sermos felizes”.

Falta De Recursos

Vivemos num tempo de escassês, tanto material como moral. O primeiro tipo tem sido defendido amplamente, portanto não vou gastar tempo aqui. O segundo tipo de pobreza, a falta de valores, tá apanhando feio no canto do ringue, e aqui saio a defendê-la.
Lembro-me de ter recebido algum ensino de moralidade no ensino médio (na época 2º grau...) por meio de duas matérias: Moral e Cívica e Estudo dos Problemas Brasileiros ou Estudos Sociais. Não me lembro de nada das duas, apenas que eram minhas aulas mais chatas. Com ambas extintas, formou-se ou apenas oficializou-se um vácuo no ensino moral nos currículos de nossas escolas brasileiras.
Hoje, por meio dos novos PCN’s (Parâmetros Curriculares Nacionais), o MEC (Min. de Educação e Cultura) órgão educacional do Governo Brasileiro, tem tentado resgatar o grande prejuízo na formação moral de gerações. Voltou-se a falar que não queremos apenas um cidadão competente, mas também uma pessoa moralmente equilibrada.
Carecemos de inteligência moral. Nossos jovens e outros tantos já adultos sofrem de analfabetismo de moralidade. A inteligência não foi treinada para o bem e a educação nos últimos anos não trabalhou para desenvolver a consciência dos valores fundamentais desejáveis. Segue-se o "raciocínio situacional", ou seja, define-se o que é o moralmente correto de acordo com aquilo que for o melhor para cada um. “Cada cabeça uma sentença”, alguém diria.
Numa sociedade democrática e plural, não adiante tentar resolver esta situação com a imposição de valores. É necessário dialogar, convencer racionalmente e acima de tudo sermos um exemplo de pessoas moralmente saudáveis e felizes.
Não poucos têm a idéia errada de que os mandamentos da Bíblia só servem para nos fazer infelizes. Pensa-se em Deus como “o-grande-estraga-prazeres-do-universo”. Entretanto, se Cristo era realmente quem disse que era - Deus encarnado - toda sua vida, ética, conduta e posicionamentos são a manifestação mais pura daquilo que de fato é a realidade. Sendo Deus, seus pensamentos eram perfeitos e sua conduta, o caminho para uma vida feliz. Logo, imitar a Cristo é a estratégia para uma vida sábia e impregnada de sentido e significado.
Os maiores problemas de nossa sociedade não são “técnicos-instrumetais”, mas morais. A questão não é a falta de conhecimento, mas de caráter e coração. Estamos tropeçando, enquanto humanidade, no mal funcionamento de nossa inteligência moral. Ainda aposta-se na corrupção, orgulho, individualismo, na maledicência, na utilização errada da sexualidade, na dificuldade para perdoar, etc, como “atalhos para a felicidade”.
Somos seres morais e enquanto negarmos isto, estaremos rumando para os abismos de uma vida na qual nunca experimentaremos satisfação. Ninguém mais agüenta o “moralismo imposto” sob a ameaça de um Deus que manda para o inferno. Temos que resgatar que Cristo não era apenas “bonzinho e religioso”, mas também uma mente perfeita na análise da realidade. Ouví-lO e obedecê-lo não tem a ver apenas com ser “religioso”, mas inteligente e sábio. Os princípios que Ele ensinou e viveu são guias seguros para uma vida que experimentará felicidade acima da média. Os recursos morais de que nossa sociedade desesperadamente precisa, encontram-se em abundância nas riquezas de Cristo.

Pensando Em Desistir?

Por vezes sou questionado com perguntas deste tipo: “você já pensou em desistir?”; “Alguma vez te passou pela cabeça abandonar a fé?”. As pessoas fazem perguntas a partir daquilo que estão sentindo. Quando queremos saber dos outros, na verdade, queremos é entender o funcionamento de nosso próprio coração.
Geralmente respondo a estas pessoas assim: “bem-vindo a raça humana!!!”. Claro que por vezes me sinto profundamente desanimado! Em parte, por minha própria personalidade muito reflexiva e introspectiva. Em parte, por que sou tão humano quanto qualquer um, e críticas desanimam; a falta de compromisso de nossos pares arrefece nosso ardor; a incompreensão e falta de amizade são espinhos que estouram o balão de nossa alegria. Minha bola está ás vezes tão esfacelada que acho que não vai dar nem pra fazer bolinha pequena chupando o pedacinho partido da bexiga colocada sobre o dedo indicador...
Onde reencontro forças? Porque Deus tem me concedido a alegria e fervor renovados de servi-lO por quase 15 anos como pastor e pelo menos 30 anos como cristão? Onde mato minha sede e refaço-me das agruras da vida? Algumas sementes de reflexão que espero lhe sirvam de refresco em meio ao deserto do desânimo:
1) Aprendi a não mudar o rumo quando estou confuso. Os momentos de fraquejo nos deixam desorientados e com vontade de partir. Já escrevi algumas vezes minha carta demissória. Não entreguei. Ajoelhei-me. Entreguei-me. Fui dormir. Na hora da confusão, nada de decisão!!!
2) Aprendi a aceitar meus erros. Por vezes somos os mais cruéis algozes com nossos próprios erros. Trancamo-nos na masmorra da culpa e açoitamo-nos com o chicote da intolerância. Sangramos lamento. Nascem fístulas de ódio de si mesmo. Erro de verdade é só aquele com o qual nada aprendemos. Aprendeu algo? Foi lição, aula de vida...não se leve tão a sério!
3) Aprendi a descansar quanto aos resultados. As pessoas querem sempre mais. Somos o tempo todo medidos por desempenho. Já ouvi muito a frase: “mas eu tive um pastor que não era assim” ou “na minha outra igreja fazíamos de outro jeito”. Atingir as expectativas de todos é suicídio da personalidade. Cristo age de mil maneiras. A graça é multiforme. Deus é quem nos julga. Faça a sua parte. A graça completará o serviço.
4) Aprendi a perdoar. Quando estamos frágeis ficamos também mais melindrosos. É verdade que as pessoas nos machucam, falam coisas tolas e injustas. É assim mesmo. São tão pecadores como você e eu. Também ofendi muito a Deus, e a outros. Abrir mão do rancor faz a alegria renascer em nosso peito. Livre-se dos andrajos da amargura. Coloque a roupa nova e limpa do amor incondicional. Perdoe, perdoe, perdoe...viva!
5) Aprendi que felicidade é o jeito como se vai. Mais importante que os resultados, é o processo. Ás vezes torcemos tanto para que um momento chegue, mas algo dá errado, e nosso ideal desce pelo ralo. Felicidade é o somatório dos bons momentos. Curta a graça nos detalhes: “O dia pode tá ruim, mas que café gostoso!”; “O projeto não deu certo, mas demos boas risadas”; “Ainda não temos casa própria, mas que sorriso lindo minha esposa tem”. Quem marca data pra ser feliz vai estar sempre correndo atrás do prejuízo cobrado na fatura da insatisfação.
Aprendi, enfim, que o desânimo é passageiro e a graça de Deus é o que perdura. Quem chuta o balde sem pensar acaba fazendo besteira e perdendo o bonde de Deus na própria vida. Deixar a fé? Como disse o nosso querido Pedrão: “Para quem iremos nós? Só Tu tens as palavras de vida eterna!”. Perseverar é um hábito que a mente aprende motivada pela fé. Aprender a perseverar na vida cristã, é recusar-se a deixar o caminho de Jesus. Caiu? Levanta! A graça nos conduzirá se firmarmos nossos passos, com a amizade dos irmãos e os olhos fitos no autor e consumador de nossa fé: Jesus Cristo de Nazaré!!!

O Shabbath E A Graça

A guarda do sábado está no centro de toda a espiritualidade cristã, entendendo-a como um princípio de vida e não como uma regra a ser seguida ao pé da letra. Quando adotamos a prática de guardar um tempo a cada semana para fazer uma pausa, estamos abrindo espaço em nossa vida para a graça de Deus.
No sábado, o povo judeu nada fazia, pois entendia que “tudo” já havia sido feito, mesmo que não estivesse. O judeu guardava o sábado como um ato de obediência, mas também de adoração e surpresa diante de tudo quanto Deus lhe havia concedido. Era um dia para estar à disposição de Deus e dos amados do coração.
Temos a tendência, depois de um tempo, de nos acostumarmos com as coisas e então deixarmos de notá-las. No início do romance, ficamos maravilhados com os diferentes tons de cor nos olhos de nossa amada sob determinado reflexo do sol sobre sua retina. Depois de um tempo, conversamos com ela sem nem ao menos olhá-la. Perdemos o “maravilhar”, tornamo-nos sonâmbulos no amor.
O shabbath para o povo de Deus tinha o objetivo de fazê-los “parar e olhar, dar atenção”. Era um dia para dizer “obrigado”. A simples admiração diante da vida, da criação, do lugar onde habitavam exigia uma resposta, um agradecimento, um shabbath. Ao resgatarmos o estilo de vida sabático estamos afirmando que não precisamos de mais nada para ser gratos. Somos gratos. Já recebemos muito, quando nada merecíamos. Trata-se de um dia para dizer que “estamos satisfeitos”. É dar um basta na febre que adoece a alma e a faz arder a todo instante atrás da última novidade. É pisar fundo no freio do carro em alta velocidade chamado “diversão-distração-dispersão”. É um dia em que perguntamos, já sugerindo a resposta adequada: “porque não nada?”. Isso é treinar o coração para perceber a bondade de Deus.
O mandamento diz “guarda o sábado para o santificar”. A verdadeira santificação exige uma vida com pausa. Não se torna uma pessoa espiritual, santa, separada para Deus, andando rápido demais. Há um jargão que devia ser revisto que diz: ‘Deus não usa os desocupados’. Não sei não, acho que não é bem assim. Davi tinha tempo para compor poemas. A meditação (tempo separado para deixar a Palavra germinar em nossa mente...uma atividade intelectual-moral intencionalmente praticada...) é sugerida por toda a Bíblia para os que desejam ser usados por Deus. Jesus cavava em sua agenda messiânica a todo instante, momentos a sós com o Pai, às vezes uma noite inteira.
Penso que Deus precisa de pessoas que saibam fazer pausas. Gente que não se sinta incompetente e ou preguiçosa ao tirar umas horas, uma tarde ou mesmo um dia inteiro para celebrar. Deus precisa de pessoas que saibam colocar em suas agendas tempo para o ócio criativo, onde a alma, à disposição do Espírito, poderá ser restaurada e tornar-se novamente fecunda para Deus, o próximo e para a Igreja.
Quando paramos e desfrutamos daquilo que o Senhor já nos deu, estamos anunciando a salvação pela fé. Parar e desfrutar, é um ato de confiança. O shabbath, expressa o descansar no trabalho e nas realizações de Deus, na justificação pela fé, na obra perfeita de Cristo na Cruz.Saber parar e descansar é um testemunho de fé num mundo viciado em agitação e barulho. É desfrutar das infinitas riquezas da graça, concedidas a todos gratuitamente, em Jesus. Praticar a desaceleração orientada pela guarda do sábado, é estar no mundo como uma testemunha viva da felicidade que só podemos encontrar no amor incondicional – não comprado e nem merecido, mas doado – de Deus em Cristo Jesus. Acho que daí vem o termo “vida desgraçada”: viver sem dar atenção a graça.

Independência Moral

Virou moda no discurso de nossos políticos o termo “choque administrativo”, que significa uma série de medidas organizacionais visando um melhor funcionamento do aparelho público, ou seja, mais resultados com menos gastos. Concordo, mas também entendo que necessitamos urgentemente de políticos dispostos a empreenderem um choque ético ou moral na vida pública de nossa nação.
Nosso problema fundamental não é a incompetência, fruto de mal preparo ou desconhecimento teórico. É claro que esta questão também existe, mas afirmo: não é nosso principal problema! Vivemos uma época de analfabetismo moral! Nossos problemas não estão na defasagem do raciocínio, mas sim do caráter e dos valores fundamentais que deveriam ornar a conduta de cada cidadão. O conhecimento moral está desaparecendo!
É claro, moralismo é algo indesejável. Um mero “kit” de regras e proibições fomentará ainda mais o comportamento contrário. Não precisamos de “ditadores” morais, mas de homens públicos que sejam “educadores de valores” por meio da conduta pública e particular.
No próximo mês elegeremos homens e mulheres para cargos da vida pública municipal. Urge compreendermos que a competência administrativa é apenas um dos quesitos que deveriam levar nosso dedinho a apertar “CONFIRMA” na urna eletrônica. Projeto político é importante conhecer sim, mas o projeto pessoal de vida também. “Quem é o candidato?; Como lida com sua família? O que as pessoas mais próximas dele dizem?” São questões também fundamentais para escolhermos nossos candidatos. Pelo menos deveria.
Sócrates, filósofo grego, afirmou: “Todas as instituições humanas, de ensino, da política, do estado, etc., são ramos da ética, pois todas têm alguma coisa a ver com a atuação do homem dentro da sociedade”. Isso é sério e verdadeiro. Nossos filhos não são formados moralmente apenas pelas instituições nas quais estão diretamente inseridos (escola, igreja, etc.). Há um contexto maior de instituições que também moldam o caráter de nossos jovens (estado, município, agremiações esportivas, etc.).
Oxalá, neste 7 de setembro estejamos levantando um clamor aos céus pela vida moral de nossa nação. A Bíblia diz que “todo aquele que comete pecado é escravo do pecado”. Que a independência de nossa nação não seja meramente política, mas que também possamos ver levantarem-se na vida pública de nossa nação homens honrados, com decência moral, respeitados por sua família e por todos de seu convívio íntimo. Afinal, governará bem um povo aquele a quem nem a própria família e amigos respeitam?

Fraqueza De Deus

Boa parte do ateísmo contemporâneo baseia-se na objeção enunciada com muita força no passado por J. P. Sartre e retomada pelos seus discípulos: “Se Deus existe, eu não sou nada”.
Se existe um Deus onipotente, o que ainda sobra para mim? Essa presença ao meu lado do poder absoluto torna irrisórias todas as minhas ações. Diante do infinito, todo o finito torna-se irrelevante. Há muitas maneiras de enunciar o argumento.
A objeção foi formulada desde a Idade Média, mas não conseguiu convencer. A resposta diz que Deus e o homem não se situam no mesmo plano, como duas liberdades em competição.
A resposta não convenceu porque durante séculos os teólogos debateram a questão da predestinação, isto é, da compatibilidade entre a liberdade de Deus todo-poderoso e a liberdade humana. Assim fazendo, situaram no mesmo plano as duas liberdades. Se os teólogos – tomistas, dominicanos e jesuítas – tomaram essa posição durantes séculos, não é estranho que filósofos façam a mesma coisa.
De qualquer maneira, a pessoa sente tantas vezes o conflito entre a sua vontade, o seu desejo e o que diz que é a vontade de Deus, que a reação parece inevitável. Os sartreanos sustentam que, para ser livre, é necessário negar a existência de Deus. Infelizmente para eles, Deus não depende das negações ou das afirmações de Sartre.
A verdadeira resposta está na fraqueza de Deus. O nosso Deus é um Deus “escondido” – tema constante da tradição espiritual cristã.
É um Deus que se manifesta no meio da nuvem, que se faz perceptível, mas não impõe a sua presença.
A liberdade consiste justamente nisto: diante do outro, a pessoa pára, reconhece e aceita que exista. Abre espaço, acolhe. Longe de dominar, escuta e permite que o outro fale primeiro. Assim Deus suspende o poder de Deus.
Nenhuma evidência, nenhuma ameaça, nenhum constrangimento força nem obriga. Deus permite e deixa fazer. Deus respeita o outro na sua alteridade e permite, até mesmo, que o outro se destrua sem intervir. A liberdade de Deus consiste em permitir e ajudar a liberdade do menor dos seres humanos. A liberdade de Deus reprime o poder. Torna-se fraca para que possa manifestar-se a força humana.
O hino de Filipenses 2.6-11, núcleo da cristologia paulina, expressa essa fraqueza de Deus. Pois o aniquilamento de Jesus incluía o aniquilamento do Pai: "Esvaziou-se a si mesmo e assumiu a condição de escravo, tomando a semelhança humana. E, achado em figura de homem, humilhou-se e foi desobediente até a morte, e morte de cruz!” (Fl 2.7-8).
Deus escondeu o seu poder até a ponto de as autoridades de Israel não o reconhecerem. É desta maneira que Deus se dirige às pessoas: sem intimidação, sem poder, na dependência de seres humanos, entregando a própria vida nas mãos de criminosos. Quem dirá que dessa maneira Deus faz violência às pessoas?
Como comentou Levinas, o outro é o desafio da liberdade, a provocação que a desperta. Diante do outro há duas atitudes: examiná-lo para ver em que ele me poderia ser útil ou qual é a ameaça que representa para mim, ou então, perguntar-me o que eu poderia fazer para ajudá-lo.
A liberdade de Deus autolimita-se. Diante da sua criatura, Deus limita sua presença. Deus preferiu antes deixar que crucificassem o seu Filho a intervir para impedir tal justiça. Trata-se de fraqueza voluntária.
É verdade que durante muitos séculos, sobretudo na pregação popular, os pregadores apresentaram uma concepção bem diferente de Deus. Usaram temas e comportamentos da religião popular tradicional: medo diante do trovão, medo da seca e de cataclismos naturais – entendidos como castigos divinos –, medo das doenças recebidas também como castigos e assim por diante.
Era fácil despertar o temor a partir de idéias puramente pagãs ou supersticiosas. Essa pregação de terrorismo religioso podia dar resultados imediatos, levando milhares de pessoas aos sacramentos. A longo prazo, porém, destruíram as bases da credibilidade da Igreja. Hoje a maioria das pessoas deixaram de ter medo do trovão, não sendo mais motivo para temer a Deus, como foi no passado. Naquele tempo achou-se válido o método do temor, todavia hoje recolhe-se os frutos dessa pastoral.
Pensou-se que os povos precisassem temer um Deus forte – e desprezariam um Deus fraco. Tais erros se pagam cedo ou tarde. Estamos pagando hoje esse preço.
Deus torna-se fraco porque ama. Quem mais ama é sempre mais fraco. Não será essa a grande característica das mulheres? Quase sempre amam mais, e, por isso, sofrem mais. Porém, nessa fraqueza consentida não estará a maior liberdade?
Nessa fraqueza a pessoa vence todo o egoísmo, todo o desejo de prevalecer, toda a preguiça de aceitar maiores desafios. Exige mais de si própria, vai mais longe, além das suas forças. “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (João 15.13). Aí está também a expressão suprema da liberdade.
A fraqueza de Deus vai até a ponto de se tornar suplicante. O versículo predileto do saudoso teólogo latino-americano Juan Luís Segundo diz; “Eis que estou batendo na porta: se alguém ouvir minha voz e abrir a porta, entrarei na sua casa e cearei com ele e ele comigo (Apocalipse 3.20).
Deus bate na porta e aguarda. Se não é atendido, afasta-se e continua o caminho. Somente entra se é convidado. Depende do convite da pessoa. Deus torna-se pedinte, suplicante.

José Comblin

Amor E Desempenho

Muito, muito cedo aprendemos que nosso valor depende de nosso desempenho. “Se sair-se bem, receberá meu amor”. Bem, isso não era falado assim, mas é o que o nosso coração ouvia. Logo, acreditamos numa mentira: o amor dos outros depende do sucesso que fazemos na vida. E assim saímos mundo a fora, querendo e tentando ser ‘tudo’ o que os outros esperam de nós. Receita certa de infelicidade.
Nossa maior necessidade torna-se também nossa maior tragédia: precisamos ter a certeza do amor alheio. Ser aceito, amado, acolhido e valorizado é o clamor do coração de todo o ser humano, ainda que muitos, os mais doentes, não reconheçam.
Pensamos que para conseguir a admiração alheia, devemos nos tornar ‘outra’ pessoa, afinal, quem nos amaria como somos? Assim começamos a incorporar comportamentos e atitudes que de fato não são nossos. Criamos estratégias de comportamento que, julgamos, serem o caminho mais curto até o carinho e respeito dos outros ao nosso redor. Desistimos do projeto de Deus, “ser eu mesmo”, e passamos a construir o “falso eu”.
Quanto mais distantes do “ser eu mesmo”, mais distantes do Pai. Deus não se relaciona com o clone de mim mesmo. Ele espera, ansioso, pelo dia em que desistiremos de ser aquilo que os outros esperam e nos tornaremos a pessoa que nascemos para ser. É necessário muita, muita coragem mesmo para deixar as máscaras caírem.
Neste baile de máscaras temos fantasias para todos os gostos e desgostos. O sedutor: pessoas muito agradáveis, um encanto, sempre nos acariciando e afagando. Desejam que os outros se apaixonem; o carrancudo: com sua cara feia e seus rosnados ocasionais entremeados por silêncio sepulcral, mais afasta do que aproxima as pessoas, mas, também consegue o que quer: respeito (ou seria medo?); o lamentador: está sempre pronto a chorar e a debulhar-se em gemidos, pois sua vida é sofrer. Assim também consegue a compaixão de alguns; o intelectual: vive no mundo dos conceitos, racionaliza tudo, não experimenta quase nada. Do seu interior corre um conta-gotas de águas vivas, mas consegue o que deseja, a admiração (que sempre vem com a inveja no mesmo embrulho); o rebelde: não se encaixa em nada, pois tem sempre uma ‘maneira diferente de ver tudo’. Os outros são sempre ‘ditadores’ e não consegue submeter-se a nada e ninguém. Ele também busca algo, a atenção; poderíamos falar também do palhaço, do valentão, do sabe-tudo, do trabalhador padrão, etc e etc. A lista seria interminável.
O problema, é que o resultado de não nos tornarmos a pessoa que nascemos para ser, será nunca nos sentirmos seguros do amor que recebemos. Afinal, amam o que não sou, logo, não me amam de verdade. O verdadeiro amor implica na busca constante do conhecimento do outro real. Enquanto isto não ocorre, os aplausos, sabemos, são todos para o ‘personagem’ que construímos.
Só existe amor onde as máscaras caem. Enquanto mantivermos a pose do nosso “tipo social”, viveremos na insegurança do amor, inclusive do amor do Pai. Deus anseia pelo dia em que pararemos de lutar pela sobrevivência de nosso próprio ego e nos lançarem, sem máscaras, em seus braços!
A liberdade dos filhos de Deus só pode ser experimentada quando abrimos mão do projeto pessoal que construímos e dizemos sim ao projeto de Deus: transformar-nos à imagem e semelhança de Cristo, onde com todas as minhas características pessoais e meu jeitão agora curado pela graça (amor imerecido), passaremos a transparecer, como filhos amados, o caráter do Pai.

Amor E Controle

Desde sempre nossa maneira de “amar” esta impregnada pela idéia de “controlar”. Nosso amor é possessivo. Declaramos “meu marido”, “minha esposa”, “meus filhos”, etc. Nosso sentido de amar é quase sinônimo de “possuir”. E assim, aquilo que entendemos como a dinâmica do amar termina por sufocar a experiência que mais poderia nos aproximar da semelhança com o criador: amar libertando.
Sei que neste momento da leitura os “possuidores de plantão” já estão com a mente repleta de argumentos: “mas quem ama cuida, protege, responsabiliza-se, é zeloso, etc.” É, eu sei disto tudo e concordo, em parte. Existe um limite saudável entre possuir e cuidar, difícil de encontrar, mas não impossível. Trata-se de saber cuidar sem manipular, exortar sem querer provocar culpa, relacionar-se sem misturar-se. Falo do amor maduro.
Sofremos demasiadamente em nossas relações afetivas porque nos misturamos com o alvo de nosso bem querer. Só ficamos “bem” quando o outro está bem. A identidade confunde-se e o projeto de vida de um fica dependente do outro. O resultado é sofrimento e uma forma de amar que em nada se parece com o amor divino.
Deus é ser pessoal e infinitamente perfeito em Sua forma de nos amar. Mas Ele nos criou livres e assim relaciona-se conosco. Sua intenção de levar-nos à perfeita maturidade, passa necessariamente por deixar-nos assumir as conseqüências de nossas decisões. Ninguém cresce fora da decisão. Isto não é abandono, mas condução ao viver responsável. Não se trata de frieza, mas de sabedoria em educar. Ele não é frio em Seu amor, mas sim comprometido em resgatar a pessoa inteira, indivíduo e indivisível que manifestou-se em plenitude na maneira de Cristo Jesus viver: o ser humano mais maduro em amor que pisou neste planeta.
Ou amamos ou possuímos. Quando nossa forma de amar o outro implica na anulação de sua individualidade, entramos no que tem sido chamado de co-dependência, também chamada de relação simbiótica. O verdadeiro amor liberta. Incentiva o outro a se tornar tudo o que nasceu para ser. Permite que o outro seja “outro”, e não tenha que viver para atender todas as suas expectativas.
Colocar limites e proteger o relacionamento nada tem a ver com aprisionar o outro nos grilhões de nosso amor. “O amor lança fora o medo”. Neste sentido, amar é também um genuíno ato de fé. Só ama assim aquele que confia em Deus. Não um Deus que levará o outro a fazer tudo o que queremos e conforme desejamos. Mas um Deus-amigo que estará sempre ao meu lado aja o que houver. Ao amar assim, permitindo que o outro tenha espaço para ser ele mesmo, aceitando as discordâncias possíveis sem retaliação, o ser humano torna-se extensão do amor de Deus na vida do outro.
É verdade que amar assim é sempre arriscado. Mas entenda: amar de qualquer forma é sempre arriscado! Não há promessas, pois o outro é sempre livre, e no fim, fará sempre o que decidir. A diferença em não misturar amor com posse é que não estaremos enganando a nós mesmos com a pretensão de que “temos tudo sob o controle” de nosso amor.
Só Deus sabe todas as coisas: passado, presente e futuro. Ele já está lá na frente em Seu amor providente. Ele e somente Ele pode cuidar em todos os momentos dos nossos queridos, e tentar fazer o papel dEle é o caminho certo para a depressão e a destruição da relação de respeito com os outros.
Amemos com fé! Saibamos reconhecer nossos limites! Livremo-nos do “controle” que se utiliza sempre das ferramentas da “culpa, sedução ou ameaça” para conduzir o outro na relação conosco. Deixemos os outros partirem emocional, física e intelectualmente para longe de nós. Como o Pai da parábola que não impediu o “filho pródigo de partir”, mas com o coração cheio de fé ficou esperando na porteira, lubrificando-a com suas lágrimas e orando baixinho Àquele que tudo pode. Afinal, como nos ensinou o “filho mais velho”, permanecer por perto (em casa) fazendo a vontade do Pai não é garantia de relacionamento honesto e comunhão real.

sábado, setembro 13, 2008

Sou Um Ateu Quando...

Sou um ateu quando se trata do deus violento da jihad
Sou um ateu quando se trata do senhor que converte pela espada
Sou um ateu quando se torna missão de políticos usar a religião como munição
Eu creio em Você, o artista das árvores e das galáxias
Eu creio em Você, o poeta dos oceanos, rios e córregos
Eu creio em Você, no Deus de compaixão que nos chama para a ação
Eu creio em Você
Eu não posso crer no que eles crêem, mas eu creio em Você
Eu creio em Você, o majestoso arquiteto do espaço e do tempo
Eu creio em Você, o compositor da beleza e da música da vida
Eu creio em Você, o santo perdoador extravagante e reconciliador
Eu creio em Você
Sou um ateu dos deuses da ganância que ignoram os necessitados
Sou um ateu dos deuses que levam os outros à tortura e ao sofrimento
Sou um ateu quando se aceita a visão dos poucos escolhidos, que julgam e condenam quem deles é diferente
Eu creio em Você, poderoso, manso e gentil em poder
Eu creio em Você, a palavra falada com boas notícias ao quebrado
Eu creio em Você, o mistério transcedente, conosco na história
Eu creio em Você

Brian McLaren e Aron Strumpel

Amor e Controle

Desde sempre nossa maneira de “amar” esta impregnada pela idéia de “controlar”. Nosso amor é possessivo. Declaramos “meu marido”, “minha esposa”, “meus filhos”, etc. Nosso sentido de amar é quase sinônimo de “possuir”. E assim, aquilo que entendemos como a dinâmica do amar termina por sufocar a experiência que mais poderia nos aproximar da semelhança com o criador: amar libertando.
Sei que neste momento da leitura os “possuidores de plantão” já estão com a mente repleta de argumentos: “mas quem ama cuida, protege, responsabiliza-se, é zeloso, etc.” É, eu sei disto tudo e concordo, em parte. Existe um limite saudável entre possuir e cuidar, difícil de encontrar, mas não impossível. Trata-se de saber cuidar sem manipular, exortar sem querer provocar culpa, relacionar-se sem misturar-se. Falo do amor maduro.
Sofremos demasiadamente em nossas relações afetivas porque nos misturamos com o alvo de nosso bem querer. Só ficamos “bem” quando o outro está bem. A identidade confunde-se e o projeto de vida de um fica dependente do outro. O resultado é sofrimento e uma forma de amar que em nada se parece com o amor divino.
Deus é ser pessoal e infinitamente perfeito em Sua forma de nos amar. Mas Ele nos criou livres e assim relaciona-se conosco. Sua intenção de levar-nos à perfeita maturidade, passa necessariamente por deixar-nos assumir as conseqüências de nossas decisões. Ninguém cresce fora da decisão. Isto não é abandono, mas condução ao viver responsável. Não se trata de frieza, mas de sabedoria em educar. Ele não é frio em Seu amor, mas sim comprometido em resgatar a pessoa inteira, indivíduo e indivisível que manifestou-se em plenitude na maneira de Cristo Jesus viver: o ser humano mais maduro em amor que pisou neste planeta.
Ou amamos ou possuímos. Quando nossa forma de amar o outro implica na anulação de sua individualidade entramos no que tem sido chamado de co-dependência, também chamada de relação simbiótica. O verdadeiro amor liberta. Incentiva o outro a se tornar tudo o que nasceu para ser. Permite que o outro seja “outro”, e não tenha que viver para atender todas as suas expectativas.
Colocar limites e proteger o relacionamento nada tem a ver com aprisionar o outro nos grilhões de nosso amor. “O amor lança fora o medo”. Neste sentido, amar é também um genuíno ato de fé. Só ama assim aquele que confia em Deus. Não um Deus que levará o outro a fazer tudo o que queremos e conforme desejamos. Mas um Deus-amigo que estará sempre ao meu lado aja o que houver. Ao amar assim, permitindo que o outro tenha espaço para ser ele mesmo, aceitando as discordâncias possíveis sem retaliação, o ser humano torna-se extensão do amor de Deus na vida do outro.
É verdade que amar assim é sempre arriscado. Mas entenda: amar de qualquer forma é sempre arriscado! Não há promessas, pois o outro é sempre livre, e no fim, fará sempre o que decidir. A diferença em não misturar amor com posse é que não estaremos enganando a nós mesmos com a pretensão de que “temos tudo sob o controle” de nosso amor.
Só Deus sabe todas as coisas: passado, presente e futuro. Ele já está lá na frente em Seu amor providente. Ele e somente Ele pode cuidar em todos os momentos dos nossos queridos, e tentar fazer o papel dEle é o caminho certo para a depressão e a destruição da relação de respeito com os outros.
Amemos com fé! Saibamos reconhecer nossos limites! Livremo-nos do “controle” que se utiliza sempre das ferramentas da “culpa, sedução ou ameaça” para conduzir o outro na relação conosco. Deixemos os outros partirem emocional, física e intelectualmente para longe de nós. Como o Pai da parábola que não impediu o “filho pródigo de partir”, mas com o coração cheio de fé ficou esperando na porteira, lubrificando-a com suas lágrimas e orando baixinho Àquele que tudo pode. Afinal, como nos ensinou o “filho mais velho”, permanecer por perto (em casa) fazendo a vontade do Pai não é garantia de relacionamento honesto e comunhão real.

Competência e Caráter

Virou moda no discurso de nossos políticos o termo “choque administrativo”, que significa uma série de medidas organizacionais visando um melhor funcionamento do aparelho público, ou seja, mais resultados com menos gastos. Concordo, mas também entendo que necessitamos urgentemente de políticos dispostos a empreenderem um choque ético ou moral na vida pública de nossa nação.
Nosso problema fundamental não é a incompetência, fruto de mal preparo ou desconhecimento teórico. É claro que esta questão também existe, mas afirmo: não é nosso principal problema! Vivemos uma época de analfabetismo moral! Nossos problemas não estão na defasagem do raciocínio, mas sim do caráter e dos valores fundamentais que deveriam ornar a conduta de cada cidadão. O conhecimento moral está desaparecendo!
É claro, moralismo é algo indesejável. Um mero “kit” de regras e proibições fomentará ainda mais o comportamento contrário. Não precisamos de “ditadores” morais, mas de homens públicos que sejam “educadores de valores” por meio da conduta pública e particular.
No próximo mês elegeremos homens e mulheres para cargos da vida pública municipal. Urge compreendermos que a competência administrativa é apenas um dos quesitos que deveriam levar nosso dedinho a apertar “CONFIRMA” na urna eletrônica. Projeto político é importante conhecer sim, mas o projeto pessoal de vida também. “Quem é o candidato?; Como lida com sua família? O que as pessoas mais próximas dele dizem?” São questões também fundamentais para escolhermos nossos candidatos. Pelo menos deveria.
Sócrates, filósofo grego, afirmou: “Todas as instituições humanas, de ensino, da política, do estado, etc., são ramos da ética, pois todas têm alguma coisa a ver com a atuação do homem dentro da sociedade”. Isso é sério e verdadeiro. Nossos filhos não são formados moralmente apenas pelas instituições nas quais estão diretamente inseridos (escola, igreja, etc.). Há um contexto maior de instituições que também moldam o caráter de nossos jovens (estado, município, agremiações esportivas, etc.).
Oxalá, neste 7 de setembro estejamos levantando um clamor aos céus pela vida moral de nossa nação. A Bíblia diz que “todo aquele que comete pecado é escravo do pecado”. Que a independência de nossa nação não seja meramente política, mas que também possamos ver levantarem-se na vida pública de nossa nação homens honrados, com decência moral, respeitados por sua família e por todos de seu convívio íntimo. Afinal, governará bem um povo aquele que nem a própria família e amigos respeitam?

sábado, abril 05, 2008

Luz-Credo



Creio no Deus desaprisionado do Vaticano e de todas a religiões existentes e por existir. Deus que precede todos os batismos, pré-existe aos sacramentos e desborda de todas as doutrinas religiosas. Livre dos teólogos, derrama-se graciosamente no coração de todos, crentes e ateus, bons e maus, dos que se julgam salvos e dos que se crêem filhos da perdição, e dos que são indiferentes aos abismos misteriosos do pós-morte.
Creio no Deus que não tem religião, criador do Universo, doador da vida e da fé, presente em plenitude na natureza e nos seres humanos. Deus ourives em cada ínfimo elo das partículas elementares, da requintada arquitetura do cérebro humano ao sofisticado entrelaçamento do trio de quarks.
Creio no Deus que se faz sacramento em tudo que aproxima, atrai, enlaça, abraça e une – o amor. Todo amor é Deus e Deus é o real. Em se tratando de Deus, bem diz Rumî, não é o sedento que busca a água, é a água que busca o sedento. Basta manifestar sede e a água jorra.
Creio no Deus que se faz refração na história humana e resgata todas as vítimas de todo poder capaz de fazer o outro sofrer. Creio em teofanias permanentes e no espelho da alma que me faz ver um Outro que não sou eu. Creio no Deus que, como o calor do sol, sinto na pele, sem no entanto conseguir fitar ou agarrar o astro que me aquece.
Creio no Deus da fé de Jesus, Deus que se aninha no ventre vazio da mendiga e se deita na rede para descansar dos desmandos do mundo. Deus da Arca de Noé, dos cavalos de fogo de Elias, da baleia de Jonas. Deus que extrapola a nossa fé, discorda de nossos juízos e ri de nossas pretensões; enfada-se com nossos sermões moralistas e diverte-se quando o nosso destempero profere blasfêmias.
Creio no Deus que, na minha infância, plantou uma jabuticabeira em cada estrela e, na juventude, enciumou-se quando me viu beijar a primeira namorada. Deus festeiro e seresteiro, ele que criou a lua para enfeitar as noites de deleite e as auroras para emoldurar a sinfonia passarinha dos amanheceres.
Creio no Deus dos maníacos depressivos, das obsessões psicóticas, da esquizofrenia alucinada. Deus da arte que desnuda o real e faz a beleza resplandecer prenhe de densidade espiritual. Deus bailarino que, na ponta dos pés, entra em silêncio no palco do coração e, soada a música, arrebata-nos à saciedade.
Creio no Deus do estupor de Maria, da trilha laboral das formigas e do bocejo sideral dos buracos negros. Deus despojado, montado num jumento, sem pedra onde recostar a cabeça, aterrorizado pela própria fraqueza.
Creio no Deus que se esconde no avesso da razão atéia, observa o empenho dos cientistas em decifrar-lhe os jogos, encanta-se com a liturgia amorosa de corpos excretando sumos a embriagar espíritos.
Creio no Deus intangível ao ódio mais cruel, às diatribes explosivas, ao hediondo coração daqueles que se nutrem com a morte alheia. Misericordioso, Deus se agacha à nossa pequenez, suplica por um cafuné e pede colo, exausto frente à profusão de estultices humanas.
Creio sobretudo que Deus crê em mim, em cada um de nós, em todos os seres gerados pelo mistério abissal de três pessoas enlaçadas pelo amor e cuja suficiência desbordou nessa Criação sustentada, em todo o seu esplendor, pelo frágil fio de nosso ato de fé.


Frei Betto

"Tu Não És Como O Tenho Imaginado"

"Senhor, é quase meia-noite e estou Te esperando na escuridão e no grande silêncio. Lamento todos os meus pecados. Não me deixe pedir mais do que ficar sentado na escuridão, sem acender alguma luz por conta própria, nem me abarrotar com os próprios pensamentos para preencher o vazio da noite na qual espero por Ti. Deixa-me virar nada para a luz pálida e fraca dos sentidos, a fim de permanecer na doce escuridão da Fé pura. Quanto ao mundo, deixa-me tornar-me para ele totalmente obscuro para sempre. Que eu possa, deste modo, por esta escuridão, chegar enfim à Tua claridade. Que eu possa, depois de ter me tornado insignificante para o mundo, estender-me em direção aos sentidos infinitos, contidos em Tua paz e Tua glória. Tua claridade é minha escuridão. Eu não conheço nada de Ti e por mim mesmo nem posso imaginar como fazer para Te conhecer. Se eu te imaginar, estarei errado. Se Te compreender, estarei enganado. Se ficar consciente e certo que Te conheço, serei louco. A escuridão me basta"
Thomas Merton

segunda-feira, janeiro 28, 2008

Espiritualidade de Baixo

Os monges do deserto, cristãos que buscaram na solidão do ermo uma experiência autêntica com Deus, falavam da importância da espiritualidade “de baixo”. Desejosos de fugirem da vida religiosa meramente de aparências e palavras bonitas, eles insistiam em que o caminho para Deus começava por baixo, pelo reconhecimento de nossas paixões e pela percepção das regiões sombrias de nossa alma.
Eles rechaçavam os “altos ideais”, as conversações sobre assuntos meramente de cima, questões celestiais e por demais abstratas que só servem para levar o homem para longe de si mesmo e sua própria realidade, devastada e aprisionada pelas paixões.
Esses mestres espirituais, dos quais o ensino não brotava da teoria, mas do andar com Deus diário, prático, que encara as situações do cotidiano não como um empecilho para a vida com Deus, mas como o único caminho para nos levar a uma relação autêntica com o Pai, diziam que antes de querermos “enfeitar o telhado de nossa casa”, deveríamos descer ao “sótão”, àquele lugar úmido em nossa alma, pouco visitado ou mesmo quase nunca, de tão assustador e desprezível.
Espiritualidade de baixo tem a ver com enxergar-se, olhar-se sem a maquiagem da piedade fingida que se mostra aos outros como “bom”. Tem a ver com o desnudar-se diante de Deus e do próximo, não desejando nunca que pensem de nós além daquilo que somos.
Por vezes, nossa intolerância com os pecados alheios, nosso desejo e tendência constante para o criticismo, caracterizado por achar defeitos nos outros e na igreja o tempo todo, trata-se do não reconhecimento dos próprios pecados, reprimidos e não tratados na presença de Deus.
Acostumados ao silêncio e à solidão, a viver na quietude onde as ilusões se desfazem e assim o auto-engano não encontra mais lugar, os eremitas do deserto se tornaram os psicólogos da antiguidade. Treinados em ouvir os sussurros da própria alma, eles não se deixavam impressionar pela espiritualidade desmedida (“de cima”), que insiste em discutir e querer ter a razão nas questões “estratosféricas” da teologia cristã, mas insistiam em prescrever a humildade como caminho para Deus. “Humilhai-vos, pois, debaixo da potente mão de Deus, e Ele, a Seu tempo vos exaltará” (I Pe.5:6), era o lema de vida destes homens.
A verdadeira humildade que conduz a Deus e não aos ídolos do próprio coração, precisa passar pelo reconhecimento de quem sou, minhas mazelas, imaturidades, paixões e idiossincrasias. Neste sentido, o reconhecimento honesto de quem sou contribuirá para tornar-me aquilo que nasci para ser. Paulo, possuía um espinho na carne que era o próprio diabo a esbofetear-lhe o rosto. Mas o poder de Deus, manifestava-se em sua fraqueza.
O caminhar cristão saudável está baseado no auto-conhecimento desprovido de ilusões onde reconheço quem sou, e da noite escura de minha alma parto em direção da luz do evangelho da glória de Cristo, buscando no auxílio de irmãos e da Palavra, nunca isolado, a cura de minhas feridas, a fim de um dia poder tornar-me aquele que aos outros consola, mas com as mesmas consolações que tenho sido consolado.

terça-feira, janeiro 15, 2008

Minha Visita Ao Mosteiro




Acabei de voltar do Mosteiro da Ressurreição, Ponta Grossa - PR. Foi uma experiência e tanto, mais pra mim do que para os monges, confesso.


Tivemos a oportunidade, eu e meu amigo Ronaldo Perini, de passar três dias dentro do claustro, o que normalmente não ocorre, pois os visitantes ficam na casa de hospedagem - afinal, monge não é "ponto turístico ou peça rara no museu da cristandade". Mas, como estava cheia a hospedaria, o Abade permitiu que entrássemos um pouco mais fundo na vida da comunidade monástica.


Não dá ainda pra entender e expressar de forma escrita tudo o que se deu comigo naqueles dias, e isso parece bastante com a ênfase da espiritualidade do deserto: o coração é mais importante que a mente, apesar desta não ser desprezada (perguntou-se a um monge se ele não tinha interesse de estudar, ao que respondeu: "entrei aqui para estudar o crucifixo, e até hoje estou tentando. O que a cruz não me ensinar, nada mais pode fazê-lo". Tal monge está lá há 61 anos...). Ainda estou digerindo a experiência. Uma coisa é colocar o nome no blog de "O Pastor E O Monge", e outra bem diferente é o "pastor tentar viver como um deles...". Mas, vamos lá...aí vão minhas impressões:


1) A vida devocional deles coloca a de qualquer evangélico no bolso. Os caras param sete vezes por dia para louvar a Deus nos ofícios, cantando salmos, lendo a palavra, confessando pecados, pedindo misericórdia a Deus. Eles lêem o Saltério todo a cada 15 dias!!! Acho que desde "Daniel na Babilônia" ninguém ora tanto...e olha que ele parava só três vezes por dia!!! Lutamos pra fazer o povo evangélico ter uma devocional de pelo penos 15 minutos por dia...e ler a Bíblia 1 vez ao ano...


2) A disciplina inserida no cotidiano pelos monges, deveria ser praticada por todos os cristãos. Eles têm uma vida regrada. Tempo de orar, de trabalhar, de alimentar-se, recreio, banho, dormir, etc. Parece escravidão, mas o dia rende extraordináriamente e eles realizam muito a cada dia. "Acho" que é na Bíblia tá escrito alguma coisa como "remi o vosso tempo". Passamos horas incontáveis diante de internet e tv, atividades que até têm o seu lugar, mas que estão se tornando o nosso "altar" diário.


3) A afetividade para com os visitantes faria vergonha ao ambiente de muitas igrejas. Nunca fui tão abraçado em tão pouco tempo...parecia que eles estavam reencontrando um grande amigo de longas datas! Num dos dias acabamos não almoçando no mosteiro e como nossa refeição foi "tarde e farta", decidimos um fazer "jejum" do jantar. Um dos monges, acho que o mais velho e o que lá está há mais tempo, percebeu nossa ausência. Quando nos encontrou, já lá pelas 20 hs, disse que não podíamos dormir sem comer nada e foi ao galinheiro, catou uns ovos e fez o melhor omelete que já comi em minha vida. De bandeja ainda passou um café fresquinho. Senti-me mais bem tratado do que em muitas igrejas que já fui pregar. Um dos ítens da regra de São Bento - que formatou em suas orientações a vida monástica - é: "receba a todos como ao próprio Cristo". Eles levam isso a sério...se seguíssemos o mesmo em nossas comunidades já teríamos experimentado um novo avivamento.


4) O monge segue a orientação do Abade, o "pastor do mosteiro". Fiquei pensando na autoridade do Abade dentro da comunidade e o carinho que todos têm por ele. Ele é o "pai" de todos e suas orientações são seguidas com reverência. É certo que há pastores que não conquistam tal relação com seu próprio rebanho por deficiências pessoais, mas, em quantos lugares o "pastor" é tratado como mero "funcionário" da igreja e que deve cumprir suas "obrigações porque ganha seu salário para isso"? Quanto sofre o coração do "pastor" por falar, falar e falar ao seu rebanho e ver-se ignorado pela comunidade? Penso no quanto o advento do "individualismo" tem gerado um sem número de homens e mulheres que não conseguem submeter-se a autoridade de um líder espiritual, pois desejam apenas "homens de Deus" que lhe sejam sempre favoráveis, um perfeito puxa-saco. Gente que pastoreia a si própria e faz do pastor o gerente do negócio religioso. Muitos aceitam o cargo.


5) O silêncio no mosteiro é intencional e praticado como regra. Até na hora da refeição eles evitam o ti-ti-ti. Enquanto comem algum monge escalado faz a leitura de algum "Pai da Igreja" e aos domingos ouvem ópera enquanto comem..."mente vazia...". A quietude é prezada por embasar a vida vivida para Deus. Sem silêncio enganamo-nos a nós mesmos e projetamos sobre "deus" nosso próprio eu. Cultivar uma vida silenciosa é a prerrogativa para alguém tornar-se "espiritual", ou seja, manifestar Cristo no viver. Queremos "Seu poder", "Sua majestade" e "Sua autoridade", mas seu estilo de vida - SILENCIOSO - , fonte de onde retirava seus recursos espirituais, desprezamos. Queremos cultos com muito movimento, barulho e entretenimento ("mantenha-nos sorrindo..."), porém, a verdadeira espiritualidade cristã é filha do silêncio, onde podemos entrar em contato não apenas com Deus, mas com nosso próprio coração, donde provêm as fontes de nosso viver. É fato que isto trata-se de um aprendizado. Ninguém se tornará "quieto" ou disposto a quietude do dia para a noite. É necessário prática, abrir espaços de silêncio no dia-a-dia e na agenda, mas se abdicarmos desta disciplina, é possível que estejamos profanando o aspecto mais fundamental da proposta da espiritualide cristã: o silêncio.




Bem, acho que escreverei mais nos próximos dias. O coração ainda está em reboliço. Enxerguei-me mais de perto, e como disse meu amigo Ronaldo, "não gostei do que vi". Foi um tempo de reavaliação da caminhada, como cristão, marido, pai, amigo...não sobrou nada! Ehehehe! Estou em reconstrução, fechado pra balanço e praticamente decretando a falência da espiritualidade que me trouxe até aqui e pela qual o mundo gospel clama, sem saber aquilo que pede: "pedra no lugar de pão". Decidi que não quero mais conquistar o mundo. Desejo apenas conquistar a mim mesmo, oferecer-me como libação ao reino de Deus, libertar-me de tudo quanto ainda me escraviza e diminui a posse do Espírito sobre minha vida. Aos navegantes aviso: algo mudou dentro de mim, e aconteceu dentro de um mosteiro...

sexta-feira, janeiro 04, 2008

Casamento: Desapaixonar-se Para Crescer...

A maré não tá pra peixe no mar dos relacionamentos. O Ibge diz que hoje no Brasil a maior parte dos divórcios se dá entre casais com até dois anos de união. Pasme! Lembra da crise dos "sete anos"? Pois é, a tolerância baixou, e agora a crise é de "dois anos".
As promessas da modernidade não se cumpriram. Diziam que "na medida em que o conhecimento da humanidade e a tecnologia aumentássem, também cresceria a felicidade". Não é o que vemos. Nunca tivemos tantos "doutores e pós-doutores" que podem ser ao mesmo tempo "analfabetos relacionais".
Desaprendemos o permanecer, o crescer juntos e ficamos correndo atrás do canto da sereia, da possibilidade de felicidade plena "no próximo relacionamento". Tomamos "pau" na matéria 'resolução eficaz de conflitos' e caminhamos vida a fora colecionando desafetos e casos mal resolvidos. Resultado: infelicidade.
É claro que não defendo que "casamento é casamento e acabou...entrou nessa agora só a morte poderá separá-los". Casamento tem que ter adjetivo: "satisfatório, proveitoso, gerador de crescimento, etc". Se não tá legal tem que se mexer, buscar solução, ajuda, o que for, mas montar em cavalo morto não dá. Aliás, tem gente que nunca busca o auto-desenvolvimento porque o cônjuge não toma atitude alguma. Tem pavor da solidão. O amor, diz a santa Bíblia, lança fora o medo. Um bom casamento tem confronto, conflito, coloca-se limites e corre-se atrás do prejuízo. Ficar fazendo cara de bonito nas fotos das festas de família, mas ir dormindo chorando, não dá. Tem gente que por medo do sofrimento desconhecido, matêm-se no sofrimento conhecido.
Um bom casamento é formado por pessoas em crescimento. É assim que o casamento fica gostoso: quando é formado por duas "pessoas" e não aquele que desemboca numa simbiose, que em geral envolve um "dominado" e um "dominador".
Um bom casamento é formado por dois seres inteiros, que curtem a si próprios antes de curtirem o outro. Falo da capacidade de ser amigo de si mesmo, ter projetos próprios, algo a fazer de suas vidas neste planeta.
Um bom casamento é aquele que abre espaço para o outro ser, dar suas opiniões, discordar, ser autêntico no assumir os próprios limites e congruente nas capacidades de "sentir, falar, pensar e agir".
Um bom casamento é libertário e não dominador. Libera-se intencionalmente o cônjuge para tornar-se tudo aquilo que nasceu pra ser: um ser inteiro, não fragmentado. Tudo aquilo que sabota o crescimento do outro é um atentado contra a liberdade.
Um bom casamento é aquele onde a perda da ilusão chamada "paixão" não gera esfriamento, mas crescimento. O amor trabalha com dados de realidade. Não dá pra amar a vida inteira um "ícone" das próprias carências. Ao tempo em que a "deusa" da paixão se quebra com o descobrimento do "outro real", forma-se aí também o húmus necessário para o amadurecimento do ser humano.
Desapaixonar-se é necessário. A paixão é o que nos torna "vivos", dizem alguns, mas não falam que depois ela nos mata. Manter-se apaixonado é tolice. Trata-se de insistir em acreditar na mentira de que "alguém" pode ser tudo para mim.
Precisamos de mais projetos - do que o 'casamento' - para nos tornarmos 'inteiros'. Precisamos de amigos, esporte, trabalho, realizações e acima de tudo de espiritualidade. Deus é fundamental para darmos conta da dor que sentimos quando a ficha cai e assumimos que a relação do casamento não é tudo que precisamos para alcançarmos "o céu em vida".
Acho que foi o grande mestre Pr.Ivênio dos Santos que propôs a seguinte dinâmica do casamento: ao invés de "deslumbramento-casamento-conhecimento-esfriamento", podemos buscar "deslumbramento-casamento-conhecimento-crescimento". Tô com ele!
Apostar todas as fichas da realização na vida no cônjuge, é covardia. Ser humano algum pode dar conta desta expectativa.
Livrar-se da paixão, deixar que ela se esvaia e até soltar fogos no dia de seu enterro é fundamental para começar a trabalhar duro na construção do amor. Amar é a construção diária de uma relação baseada em 'respeito, liberdade e espiritualidade'. Sem este tripé não funciona.
Vejo em Jesus Cristo o ser humano (sem deixar de ser Deus...) que todos nós nascemos para ser. Ele foi completo, inteiro consigo, o próximo e com Deus. Soube ser com os outros, sem impor que os outros fossem como ele e também não aceitando dominação alheia. Em Jesus encontramos a fonte que pode nos sustentar em meio aos desertos da relação conjugal. Ele, por Sua obra redentora, objetiva reconstruir-me à imagem e semelhança do Pai, restaurando minha humanidade e tornando-me apto para aprender a amar o outro de forma madura e geradora de crescimento. Cristo oferece-se para ser o interlocutor de minhas relações verticais e horizontais. Ao permitir que Ele lidere nossas vidas, teremos encontrado muito mais do que "um mapa" para as relações. Ele se dispõe a ser "o guia" seguro, e se obedecermos ao Seu "segue-me", a promessa não é de que o casamento será perfeito, mas sim que fomentará o ambiente necessário para que nos tornemos tudo o que nascemos para ser: seres em constante crescimento, até atingirmos a estatura do "varão (homem) perfeito" - Cristo!!!

terça-feira, janeiro 01, 2008

Quem Sou Eu?


Wer Bin Ich? Quem Sou Eu? Quem sou eu?

"Freqüentemente me dizem que saí da confinação da minha cela de modo calmo, alegre, firme, como um cavalheiro da sua mansão. Quem sou eu?
Freqüentemente me dizem que falava com meus guardas de modo livre, amistoso e claro como se fossem meus para comandar. Quem sou eu?
Dizem-me também que suportei os dias de infortúnio de modo calmo, sorridente e alegre como quem está acostumado a vencer. Sou, então, realmente tudo aquilo que os outros me dizem? Ou sou apenas aquilo que sei acerca de mim mesmo? Inquieto e saudoso e doente, como ave na gaiola, lutando pelo fôlego, como se houvesse mãos apertando minha garganta, ansiando por cores, por flores, pelas vozes das aves, sedento por palavras de bondade, de boa vizinhança, conturbado na expectativa de grandes eventos, tremendo, impotente, por amigos a uma distância infinita, cansado e vazio ao orar, ao pensar, ao agir, desmaiando, e pronto para dizer adeus a tudo isto?
Quem sou eu? Este, ou o outro? Sou uma pessoa hoje, e outra amanhã? Sou as duas ao mesmo tempo? Um hipócrita diante dos outros, e diante de mim, um fraco, desprezivelmente angustiado? Ou há alguma coisa ainda em mim como exército derrotado, fugindo em debanda da vitória já alcançada?
Quem sou eu? Estas minhas perguntas zombam de mim na solidão. Seja quem for eu, Tu sabes, ó Deus, que sou Teu!"


Dietrich Bonhoeffer foi um grande teólogo protestante alemão, considerado um dos mais relevantes do século XX. Perseguido e aprisionado pelo nazismo, foi enviado a um campo de concentração, onde foi executado, já em fins da Segunda Guerra.Para mais textos e informações sobre Bonhoeffer, visite:http://www.sociedadebonhoeffer.hpg.ig.com.br/olegado.htm.